Icone coração Doações Icone coração Ouvidoria

Jornalista relembra entrevista histórica com Irmã Dulce

23 de September de 2021

A conversa da jovem repórter com o Anjo Bom ocorreu quase às vésperas da criação da entidade, que décadas depois se tornaria um dos maiores complexos de saúde do país com atendimento 100% gratuito. Com a instalação da OSID, a religiosa daria um novo passo, traduzindo com fidelidade a essência de sua missão: construir um hospital para acolhimento dos mais necessitados.

Embora tivesse conhecimento do trabalho excepcional que Irmã Dulce realizava, a jornalista só a conhecia “de vista”. A personagem central de sua matéria era irmã de sua amiga de infância, Ana Maria Lopes Pontes: “Temos a mesma idade e uma amizade do bem, que ainda cultivamos”, conta Ana, lembrando que Mara costumava ver Irmã Dulce, em sua casa, quando a religiosa ia visitar a família. “Numa dessas vezes, chegarmos a nos sentar à mesa para o almoço em companhia de Dr. Augusto, pai delas. Mas foi através da reportagem que tive a oportunidade de conversar com a freira”, conta a jornalista. 

Cinema e tevê – Como repórter, Mara conheceu “a Irmã Dulce administradora, produtora cultural e empreendedora; uma mulher de ação por trás do hábito de freira e muito à frente do seu tempo”. A entrevista foi concedida no trajeto entre o bairro da Graça e o aeroporto, enquanto a religiosa se dirigia a uma de suas numerosas missões sociais. Dessa vez, iria recepcionar Ferdinando Aguiar, diretor da Companhia Campos Elíseos Cinematográfica de São Paulo. Ele desembarcava em Salvador trazendo um filme brasileiro para o lançamento da campanha de Irmã Dulce em benefício da construção do hospital e albergue.

À repórter, a freira falou de uma iniciativa arrojada. “Ela já tinha uma visão de mídia”, relata Mara. Assim, cuidou para que a fita fosse exibida com exclusividade na Bahia, a fim de atrair um bom público ao Cine Roma. O objetivo era um só: ampliar o amor e o serviço a quem mais precisava. Prevendo o lançamento da televisão no estado, Irmã Dulce organizou a venda de ingressos com direito ao sorteio de um aparelho de tevê top de linha. E usou de tanta dedicação para passar os ingressos, que nem a repórter escapou. Dias depois de publicar sua matéria no jornal, ela recebeu uma carta assinada pela religiosa: “Mara, paz e bem! Santo Antônio envia os bilhetes e manda dizer que não aceita devolução. O recado é d’ele e, por isso, espero que você faça tudo para passar todos. Deus a recompense!”.

Na época, boa parte do trabalho social de Irmã Dulce consistia em acolher doentes das ruas de Salvador. Em sua matéria, a jornalista registra que só em 1958 foram acolhidos 516 sem-teto no Albergue Santo Antônio, anotando os dados junto a uma declaração incisiva da freira: “Não é preciso ir à África, a fim de encontrar os necessitados”.

Para além do perfil da missionária a quem os baianos já reconheciam como santa, Mara Guimarães revelou as feições de sua humanidade desconcertante, que a impressionou pela “dicotomia entre a fragilidade do corpo e a força que nela habitava”. Hoje, fazendo uma leitura mais filosófica, vê Irmã Dulce como “uma personagem mitológica”. Mas o sentimento é o mesmo de quando a descreveu em sua matéria, seis décadas atrás: “Aquela freira que estava junto de mim, não era outra, senão a Irmã Dulce, solicitada na hora da morte por mil almas que sofreram e que foram felizes por causa dela”.

Jornalista relembra entrevista histórica com Irmã Dulce