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Cine Roma volta à cena cultural da cidade

15 de May de 2006
A estréia da peça Irmã Dulce: um ato de Deolindo Checcucci não será apenas uma homenagem ao Anjo Bom, mas o resgate de um dos templos da cultura de Salvador e de seus moradores. O Cine Roma foi inaugurado em 27 de novembro de 1948, e desde 1983 não é mais palco de shows de cantores como Roberto Carlos, Raul Seixas, Jerry Adriani, Wanderléia ou Waldick Soriano ou das imensas filas para assistir aos filmes que causavam furor nas décadas de 50 e 60 do século passado. Os anos 70 viram a decadência gradual do espaço, como reflexo da expansão de Salvador rumo aos novos bairros do além Comércio. Os dois primeiros filmes exibidos foram "Diabo Branco", com Rossano Brazzi e Annete Bach, e "Cordas Mágicas", além dos dois primeiros capítulos da série "A sombra misteriosa". Pela telona do Roma desfilaram divas das 'estranjas' como Rita Hayworth e Doris Day e também tropicais como Norma Benguell e Leila Diniz. Apesar do apelo das estrelas, os filmes quase sempre eram ‘fitas de família’, comédias, aventuras, filmes católicos como "Marcelino Pão e Vinho", de bang-bang, piratas e épicos. A tristeza com o fim do Cine Roma já era refletida pelos jornais de Salvador no final dos anos 70. Assim se referiu o Jornal da Bahia, em 11 de outubro de 1979, aos bons tempos do cinema: "Os três portões centrais do Cine Roma eram abertos para acolher um ansioso público que, em filas quilométricas, contava os minutos que faltavam para assistir a um grande filme ou a um show do seu ídolo preferido". Há quem recorde o tempo em que Jerry Adriani agitou a Cidade Baixa, cantando no Roma. Também havia público para Waldick Soriano, que "dilacerava corações". O operariado tinha gosto variado, e o Cine Roma era do operariado também. Os primeiros freqüentadores do cinema eram trabalhadores da classe média da Cidade Baixa, principalmente. Além de pessoas residentes no subúrbio ferroviário, que iam de trem até a estação da Calçada e, de lá, andavam até o Roma para assistir a um bom filme. Como relatam Geraldo da Costa Leal e Luis Leal Filho, no livro "Um Cinema chamado Saudade", era comum que, à noite, chefes de família, em companhia das esposas, freqüentassem o Roma. Templo do Rock O cinema fundado por Irmã Dulce e pelo frei Hildebrando Kruthaup tinha a função de garantir fundos para o Circulo Operário da Bahia e não se restringiu apenas à exibição de filmes, tendo intensa atividade sociocultural. Não faltaram festivais de música, peças teatrais, congressos e até concursos de beleza. O Cine Roma foi marcado por sua versatilidade e chegou a ser chamado de "Templo do Rock" na década de 60. As sessões da Jovem Guarda, comandadas por Waldir Serrão, o Big Ben, aconteciam sempre pela manhã, evitando interrupções nas programações normais do cinema. Nessa época Raulzito e seus Panteras despontavam como a melhor banda de rock da cidade. Nos anos 60 muita gente cantou no Roma: Jerry Adriani, Wanderléia, Renato e Seus Blue Caps, Ângela Maria, Caubi Peixoto, Marlene, Quarteto em Cy e Emilinha Borba. E também o Rei Roberto Carlos que em 6 de junho de 1965, cantou pela primeira vez na Bahia, e no Cine Roma. O "Rei" foi acompanhado pelos Panteras. Irmã Dulce sempre deu incentivo aos amantes do rock'n'roll da Cidade Bahia. Nos tempos em que a Jovem Guarda se apresentava no Roma, eram comuns os excessos e, ao final de cada espetáculos, algumas cadeiras quebradas. A direção do Círculo Operário queixava-se à freira que sempre 'passava a mão na cabeça' de Waldir Serrão e permitia os encontros da turma que tanto agitava o cinema. Raul Seixas registrou em sua biografia a importância do Cine Roma na época de grande rivalidade entre a turma da Jovem Guarda e os amantes da Bossa Nova. "A Bossa Nova estava arretada em Salvador. E era uma guerra. De um lado o Teatro Vila Velha, de outro o Cinema Roma, que era o templo do rock", disse Raul.

Cinema representa o art déco em Salvador

Construído em dois níveis, o Cine Roma equivalia em tamanho ao Pax e ao Jandaia, e tinha capacidade para 1850 espectadores. O prédio é um exemplo soteropolitano da arquitetura Art Déco. O movimento que representou a adaptação pela sociedade de massa dos princípios do cubismo se manifestou na arquitetura, nas artes plásticas, no design gráfico, e no design industrial a partir da década de 1920 e ganhou força nos anos 30 na Europa e nas Américas. Edifícios, esculturas, jóias, luminárias e móveis são geometrizados. No Brasil, o movimento influenciou artistas como o escultor Vítor Brecheret (1894-1955) e o pintor Vicente do Rego Monteiro (1899-1970). Uma obra de Brecheret fortemente influenciada pelo art déco é o Monumento às Bandeiras, em São Paulo. Na arquitetura art déco, as fachadas têm rigor geométrico e ritmo linear, com fortes elementos decorativos em materiais nobres. Dois exemplos são o Empire State Building e o Rockefeller Center, em Nova York.
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